Em 2014, a Natura conseguiu um benefício que a isentou de pagar em torno de R$ 400 milhões em impostos. Agora, as outras marcas tentam a redução tributária. Mas, ao contrário da concorrente, que teve a isenção aprovada em poucos dias, as demais esperam a permissão há muito mais tempo
Duas grandes empresas de cosméticos que atuam no país tentam, ainda sem sucesso, benefícios fiscais como o recebido pela Natura no Distrito Federal. Em 2014, um acordo assinado entre a multinacional e a Secretaria de Fazenda do DF rendeu à marca um desconto estimado por auditores da Receita da ordem de R$ 400 milhões no pagamento de impostos, como revelou o Metrópoles em reportagem veiculada no dia 28 de abril.
Agora, o Metrópoles teve acesso a documentos demonstrando que a Mary Kay do Brasil e a Avon Cosméticos Ltda entraram com pedido para revisão do pagamento do Imposto sobre Operações Relativas à Circulação de Mercadorias e sobre a Prestação de Serviços de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação (ICMS). Essas empresas querem que a base de cálculo do imposto usada por elas siga as mesmas regras determinadas no Termo de Acordo de Regime Especial (Tare) nº 14 de 2014, assinado com a Natura.
O Metrópoles mostrou, no dia 28 de abril, que o Tare nº 14 de 2014 permitiu que o ICMS pago pela empresa seja calculado sobre o preço dos produtos vendidos às consultoras, e não sobre o valor definido nos catálogos, como determina a legislação. Essa alteração na base de cálculo foi justamente o que reduziu o valor devido ao Fisco do DF.
No caso da Natura, o pedido de revisão do pagamento de ICMS foi protocolado na Secretaria de Fazenda em 18 de agosto de 2014. Três dias depois, em 21 de agosto, a demanda da empresa foi atendida. A Mary Kay fez uma solicitação semelhante em 31 de agosto do ano passado. A Avon, por sua vez, pediu um regime especial para o cálculo de impostos no dia 22 de abril deste ano. Mas, tanto no caso da Mary Kay, quanto da Avon, a análise ainda está pendente.
Após a publicação da reportagem do Metrópoles, a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara Legislativa convocou o secretário de Fazenda, João Antônio Fleury, e o secretário adjunto da pasta, Wilson José de Paula, para darem explicações sobre o acordo assinado com a Natura.
Contra a legislação
Os conselheiros do Tribunal Administrativo de Recursos Fiscais do Distrito Federal (Tarf), da Secretaria de Fazenda do DF, consideram que a base de cálculo do ICMS usada pela Natura contraria a legislação em vigor. Por conta disso, foram lavrados cinco autos de infração contra a empresa. Os integrantes do Tarf, inclusive, rejeitaram, em março deste ano, por unanimidade, um recurso da empresa contra os autos.
Entenda o Tare
O Tare é um tipo de acordo firmado entre a Secretaria de Fazenda e uma empresa, com regras especiais para desburocratizar o dia a dia do estabelecimento comercial. Essas normas, no entanto, não autorizam alterações nos critérios de base de cálculo. O artigo 71 da Lei Distrital nº 4.567/2011, que disciplina o Tare, diz: “A adoção de regime especial de emissão e escrituração de documentos fiscais e de apuração e recolhimento de obrigação tributária, com o objetivo de facilitar o cumprimento das obrigações fiscais, poderá ser autorizada, mediante requerimento do interessado na forma que dispuser o regulamento”.
As normas tributárias, no entanto, só permitem modificações na base de cálculo do ICMS por meio de lei, convênio ou protocolo. E as leis dependem do crivo do Poder Legislativo.
Explicações na Câmara
Procuradas pelo Metrópoles, as empresas de cosméticos não se posicionaram sobre o tema até a publicação desta reportagem. A Natura se posicionou sobre o assunto em e-mail enviado à reportagem. Segundo a empresa, não há nenhuma ilegalidade na operação, pois todo o processo está amparado em um termo com base judicial.
A Secretaria de Fazenda informou que “todas as considerações sobre o assunto e demais esclarecimentos em relação ao Tare serão dados na oitiva marcada para a próxima terça-feira (31/5), na Comissão de Constituição e Justiça da Câmara Legislativa.”
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