A Natura, criada há 45 anos, passa por uma espécie de crise da meia-idade. A companhia que chegou ao topo do setor de higiene e beleza pelas mãos de sua força de vendas e um apelo sustentável vê a necessidade de se diversificar para crescer mais, mas não consegue se movimentar na velocidade que o mercado exige. Enquanto isso, a concorrência avança.
Para especialistas do mercado e ex-executivos da Natura, o processo decisório da companhia é lento. Qualquer movimento é excessivamente analisado, o que não combina mais com um setor agressivo. Terceiro maior do mundo, o mercado brasileiro de higiene e beleza cresceu 90% nos últimos cinco anos e somou R$ 91,6 bilhões em vendas ao consumidor em 2013, segundo a Euromonitor.
Um consenso no mercado é que a companhia precisa de uma estratégia concreta no varejo de massa no curto prazo. Em 2012, a empresa abriu uma loja temporária em São Paulo, como teste. No fim do ano, fechou o ponto e afirmou que queria ter novas unidades, em mais capitais do país. Não há, no entanto, nenhuma loja em funcionamento até hoje.
A grande preocupação da Natura é não criar conflito com suas 1,3 milhão de consultoras no Brasil. No projeto piloto, as revendedoras cadastradas recebiam comissão sobre as vendas feitas na loja. A companhia também lançou recentemente, nos três maiores mercados do Sudeste, o serviço de venda on-line que testava há dois anos no interior de São Paulo, no qual cada consultora tem sua página.
A empresa comprou a Aesop, rede de lojas de cosméticos premium, em 2012, uma operação à parte que terá sua primeira loja em São Paulo este ano. O novo presidente da Natura, Roberto Lima, afirma que projetos no varejo e o lançamento de outras marcas estão em estudo. Não se sabe, no entanto, quando isso ocorrerá.
“A Natura, necessariamente, já deveria, há mais tempo, ter avançado para o varejo. Ela precisa operar no conceito multicanal”, diz Marcos Gouvêa de Souza, diretor-geral da consultoria GS&MD. Para o consultor, a perda de fôlego do canal de venda direta nos últimos anos se deve, em parte, porque o emprego formal afastou as mulheres dessa atividade.
Segundo fontes, a empresa estuda criar uma marca de produtos mais baratos, desconectada da Natura. Em 2013, foi lançada a submarca Natura Sou, com preços semelhantes a de itens vendidos em supermercados. “Na marca Natura, as coisas são feitas com um cuidado extraordinário. Com uma marca nova, talvez eles possam ganhar uma velocidade maior”, diz Guilherme Assis, analista da Brasil Plural. Unilever, P&G e L’Oréal e a brasileira Hypermarcas investem mais em seus produtos de beleza vendidos no varejo tradicional.
Silenciosamente, O Boticário entrou no terreno da Natura nos últimos dois anos. Analistas estimam que a empresa já tenha de 500 mil a 800 mil revendedores no Brasil, que se abastecem de produtos nas lojas dos próprios franqueados. O grupo paranaense, com 3,8 mil lojas, projeta crescer 16% este ano. Além da marca criada há 37 anos, o grupo lançou novas operações, como a rede Quem disse, Berenice?, a Beauty Box e a Eudora nos últimos anos. Esta última deveria ser a marca de venda direta do grupo, no entanto, O Boticário é que teve maior sucesso.
“A Natura subestimou ou não se atentou para esse movimento”, diz Marcelo Pinheiro, sócio-diretor da consultoria DirectBiz, especializada em venda direta. Para ele, a companhia poderia ter dado uma atenção maior para o públicos de classe C e D, que foram atingidos pelo novo canal da concorrente. O Boticário desbancou a Natura da liderança em perfumaria em 2013.
Nos últimos anos, o canal ganhou outros novos entrantes, como Jequiti e Belcorp. A Mary Kay ajustou sua estratégia e ganha espaço na classe B. A Avon também vem perdendo mercado e aposta na parceria com outras empresas, como a multinacional de fragrâncias Coty, para melhorar as vendas.
No ano passado, a receita líquida da Natura foi de R$ 7 bilhões. No Brasil, o indicador cresceu 4,8% e, nos nove primeiros meses deste ano, 4,2%. “Ela está sendo contestada dentro do próprio canal, que também tem crescido abaixo do mercado, que por sua vez também está crescendo menos”, explica Assis. A Euromonitor projeta que o setor de higiene e beleza avance menos nos próximos 5 anos: 37%.
O “sonho” de ser uma empresa internacional, algo destacado por Lima na entrevista, também pode ter atrapalhado a Natura nos últimos anos, na avaliação de especialistas. O foco em sustentabilidade, que a empresa diz não abrir mão, também é um fator limitante. Lima diz que uma de suas missões é dar agilidade à Natura. Recebeu o Valor na segunda-feira, 55 dias após assumir o cargo, e disse ter “bastante coisa para fazer”.
Fonte: http://www.valor.com.br/empresas/3768924/concorrentes-avancam-e-tomam-mercado-da-lider
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