Após mais de nove anos no cargo, Alessandro Carlucci vai deixar a presidência da Natura. A partir de 8 de setembro, o principal executivo da empresa de cosméticos será Roberto Lima, ex-presidente da Vivo e da Credicard e conselheiro da Natura entre 2012 e o início de 2014. Está prevista uma transição até o fim do ano, quando Carlucci deve se desligar da empresa onde esteve por 25 anos.
A Natura afirmou que a decisão de deixar a empresa partiu de Carlucci. A escolha do novo presidente foi feita de forma discreta, como é de praxe na empresa. Discrição também é uma característica atribuída a Lima. Ontem foi o último dia do executivo no grupo de comunicação Publicis Worldwide, que comandava desde janeiro.
Lima chega à Natura num momento de adaptação de seu modelo de negócios. A incorporação de ferramentas digitais no processo de venda é o principal projeto da companhia e ainda está no início de sua implementação. A empresa também está testando a ampliação de seu portfólio, com a venda de artigos de decoração e moda pela internet, e a entrada no varejo. Até o fim do ano, devem ser abertas as duas primeiras lojas no Brasil da marca australiana Aesop, adquirida em 2012 pela Natura.
As iniciativas são percebidas como de longo prazo, e analistas têm cobrado maior urgência da empresa para retomar o vigor do negócio e defender sua liderança. Especialistas da Brasil Plural afirmaram, em relatório, que a transição no comando da Natura pode melhorar o “timing” e a dimensão da resposta da empresa.
O desafio de Lima será acelerar o processo de transformar a Natura em uma empresa multicanal e multicategoria e tentar recuperar a participação de mercado perdida no Brasil nos últimos três anos. O executivo também terá a missão de gerir um exército de 1,3 milhão de consultoras no país e conquistar novas representantes na transição para o modelo digital. Nos pedidos feitos via internet, a entrega é feita diretamente ao consumidor, mas uma revendedora é indicada como intermediária na compra.
Em conversa com analistas ontem, o vice-presidente de finanças da Natura, Roberto Pedote, lembrou que Lima participou da aprovação de decisões estratégicas da companhia no conselho e afirmou que sua designação mostra compromisso do colegiado com a continuidade dos projetos em implementação.
A pressão por resultados é crescente na Natura, líder no mercado de higiene pessoal, cosméticos e perfumaria, que tem sofrido com a concorrência acirrada no setor. Empresas que atuam com franquias e no varejo ganharam mais espaço. No segundo trimestre, a receita da Natura subiu apenas 1,8% no Brasil em relação a igual período do ano passado, e o lucro líquido caiu 26,8%.
Lima comandou a Vivo entre 2005 e 2011, liderou o processo de migração da tecnologia de telefonia móvel da segunda geração para a terceira geração (3G) e devolveu a rentabilidade à operadora. Para os analistas da Brasil Plural, um atributo importante da experiência do executivo na Vivo foi o foco em desempenho operacional e esforços de corte de custos.
O executivo participa atualmente do conselho de grupos como Telefônica Brasil e Pão de Açúcar. Na visão da equipe da Brasil Plural, a vasta experiência de Lima como conselheiro e executivo ressalta sua habilidade de circular em diversas partes, o que pode ser útil para a Natura, que precisa lidar com eventuais opiniões divergentes entre os três fundadores e principais acionistas da companhia.
“Achamos que a Natura está passando por um momento desafiador de defender sua posição como líder no segmento de higiene pessoal, perfumaria e cosméticos no Brasil e talvez a administração quisesse trazer alguém novo, menos enraizado no lema ‘bem estar bem’ da companhia, para promover ajustes no curso da companhia”, afirmam os analistas da Brasil Plural.
Ao longo dos anos, Carlucci construiu seu comitê executivo, e alguns de seus membros eram cotados para a sucessão. Era o caso do vice-presidente de marcas e negócios, José Vicente Marino, ex-presidente da Johnson & Johnson no Brasil, que chegou à empresa em 2008, e Pedote, que veio da Nokia em 2009. Pedote afirmou ontem aos analistas que não há nenhuma mudança adicional no quadro administrativo relacionada à saída de Carlucci.
Carlucci, de 47 anos, foi praticamente o único presidente da companhia desde que a Natura abriu o capital, em maio de 2004. O executivo assumiu o cargo em março de 2005, substituindo o fundador Pedro Passos. Ele é bem quisto pelos acionistas e foi preservado em momentos de fragilidade, como em 2007, quando a Natura também perdia mercado e rentabilidade. Carlucci ingressou na empresa em 1989 e era vice-presidente comercial antes da última promoção. Durante sua gestão, a receita líquida da Natura subiu quatro vezes, para R$ 7 bilhões. O lucro antes de juros, impostos, depreciação e amortização (Ebitda) cresceu 3,7 vezes, para R$ 1,6 bilhão.
Para o Deutsche Bank, a chegada de um novo presidente deve trazer volatilidade às ações da Natura no curto prazo. “O conselho e o comitê executivo passaram por decisões difíceis nos anos recentes. Agora que a hora de implementar tais iniciativas estratégicas chegou, Carlucci, que iria desempenhar um papel vital em tocar com êxito esses projetos, está fora”, destaca o analista Marcel Moraes.
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