“Estamos nos preparando para um mundo no qual metade dos negócios será no comércio eletrônico e 80% das interações dos consumidores se darão on-line.”
Ao estimular mais atividades on-line, as quarentenas contra a covid-19 desencadearam amplas mudanças na forma como as mulheres descobrem e compram produtos de beleza, em especial nas faixas de idades mais elevadas, até então cautelosas na internet, segundo a diretora de operações digitais da L’Oréal, Lubomira Rochet.
“A crise acelerou profundamente a transformação digital no setor de beleza”, disse a executiva, em entrevista ao “Financial Times”. “No comércio eletrônico, atingimos em oito semanas o que de outra forma teria nos levado três anos.”
A L’Oréal, maior fabricante mundial de cosméticos em vendas, acredita que boa parte desse novo comportamento dos consumidores continuará mesmo depois de a pandemia perder força. Novas ferramentas de marketing, como testes virtuais de maquiagem e tintura de cabelo e consultas de beleza personalizadas em conversas por vídeo, também se mostraram de grande utilidade diante das lojas fechadas.
Mesmo antes do surgimento do coronavírus, o setor de cosméticos já estava bem avançado na adoção do comércio eletrônico e do marketing digital do que outras categorias de bens de consumo, como as de alimentos ou produtos de uso doméstico.
L’Oréal e Estée Lauder, líderes no mercado, investiram alto nos últimos anos para ampliar seu poder de fogo digital, com novas marcas encabeçadas por celebridades, como Huda Beauty e Charlotte Tilbury, tendo crescido rapidamente ao atrair consumidores por meio das redes de relacionamento social on-line.
Atualmente, cerca de 20% da receita da L’Oréal vem dos sites de suas próprias marcas ou do varejo on-line de empresas como Amazon e Walmart. No primeiro trimestre deste ano, as vendas do grupo francês por comércio eletrônico cresceram 53% em comparação ao mesmo período de 2019.
Por outro lado, nos mesmos meses, a Unilever, que vende alimentos processados e bens de uso doméstico, além de produtos de beleza, ganhou 8% da receita na internet, enquanto a Nestlé, maior processadora mundial de alimentos, obteve 10% da receita por canais de comércio eletrônico.
Salões de beleza e lojas de departamento ficaram fechados durante os lockdowns, mas algumas varejistas por meio das quais a L’Oréal normalmente também vende continuaram abertas, como as farmácias. Rochet disse que, de início, os consumidores estocaram produtos de cuidado pessoal, como o xampu Garnier, mas, depois, ao perceberem que as medidas de confinamento se estenderiam, passaram a comprar produtos como tintura de cabelo, esmalte para unhas e máscaras faciais de beleza para uso em suas próprias casas.
Com parte de seus canais de distribuição fechados, as vendas comparáveis da L’Oréal no primeiro trimestre caíram 4,8% em relação aos mesmos meses de 2019. O Barclays prevê declínio de 9,2% nas vendas da empresa deste ano e uma recuperação em 2021, com crescimento de 7,8%.
Apesar da queda nas vendas, foi possível ver alguns raios de luz nesta crise. A L’Oréal rapidamente transferiu uma maior parte de seus investimentos em marketing e publicidade para a internet, elevando a proporção de 50%, antes da pandemia, para cerca de 70%.
Como resultado, o comércio eletrônico cresceu a passos rápidos mesmo em regiões onde originalmente estava pouco desenvolvido. Por exemplo, na América Latina, as vendas on-line saltaram 300% em abril e, na África e Oriente Médio, 400%.
A crise também levou mais varejistas nas quais a L’Oréal vende seus produtos a incrementar seus próprios serviços on-line. Um total de 15 empresas, entre as quais Amazon, Boots e AS Watson, agregaram a tecnologia de testes virtuais de produtos da L’Oréal, chamada ModiFace, a seus sites e aplicativos. Em média, os consumidores passaram nove minutos usando o ModiFace para experimentar virtualmente tons de tintura de cabelo ou de base neles mesmos. Antes da crise, passavam dois minutos, em média.
“A ModiFace tem sido uma grande vantagem competitiva para nós nesta crise”, disse Rochet, que convenceu o executivo-chefe da L’Oréal, Jean-Paul Agon, a comprar a startup canadense em 2018.
A L’Oréal havia definido suas metas de transformação digital em 2013. Na época, consistiam em chegar a 2020 com 20% das vendas por meio de comércio eletrônico e com metade dos investimentos em marketing direcionados à internet. Esses objetivos foram atingidos agora graças à mudança no comportamento dos consumidores trazida pelo coronavírus. A L’Oréal pretende pensar ainda mais alto no mundo digital daqui para a frente, segundo Rochet.
“Tínhamos metas para o segundo estágio de nossa transformação digital, mas a covid-19 mudou o cenário profundamente, então temos que reavaliá-las”, disse.
“Estamos nos preparando para um mundo no qual metade dos negócios será no comércio eletrônico e 80% das interações dos consumidores se darão on-line.”
As ações da L’Oréal agora são negociadas a valores relativos que não se viam desde 2003. A relação entre preço e a projeção de lucro está em cerca de 35 vezes, segundo a S&P Global Market Intelligence. No acumulado do ano, as cotações agora estão praticamente estáveis, depois de terem se recuperado da queda de 21% observada entre janeiro e meados de março.
Fonte: https://valor.globo.com/empresas/noticia/2020/06/15/ft-loral-redesenha-seu-futuro-digital.ghtml
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