A Natura começa a colher os frutos de uma mudança na forma de medir o progresso socioambiental em uma das regiões em que atua no Estado do Amazonas. A empresa viu aumentar o chamado Índice de Progresso Social (IPS) da região, de acordo com dados obtidos com exclusividade pelo Estadão/Broadcast. Concebido pelo economista Michael Porter, ele é uma espécie de nova forma de medir o PIB e junta aspectos econômicos, sociais e ambientais.
Isso aconteceu após uma adaptação do indicador para a realidade local, o que, segundo a Natura, ajudou a planejar de forma mais certeira o modo de agir na região, e também trouxe ganhos para a cadeia de fornecimento da empresa. Para especialistas, projetos socioambientais precisam ter métricas comparáveis, mas elas não necessariamente podem ser mensuradas da mesma forma em todos os lugares.
A Natura alterou as métricas do IPS para aplicá-lo à realidade do Programa Território Médio Juruá, que toca na unidade de conservação federal do Estado do Amazonas. A adaptação foi importante para medir o avanço de um programa criado pela empresa em 2018 que chegou ao fim do primeiro ciclo em 2020. O IPS foi criado pela organização internacional Social Progress Imperative para inserir as questões sociais nas métricas do PIB. No ano passado, o Brasil ficou em 61º lugar entre 163 países na pesquisa, de acordo com a organização.
A iniciativa da Natura, uma parceria com a Coca-Cola, levantou R$ 16,8 milhões para o desenvolvimento sustentável da região com auxílio da Sitawi, organização que desenvolve soluções financeiras para impacto social, e teve apoio da Agência Internacional dos Estados Unidos para o Desenvolvimento (Usaid, na sigla em inglês). “Os principais pontos para os quais desenvolvemos soluções a partir das medições anteriores foram o empreendedorismo local, com investimento na produção de óleo e manteigas e do manejo sustentável do pirarucu; educação básica, com foco em agroecologia; e acesso a rede elétrica e inclusão digital”, diz Luciana Villa Nova, gerente de sustentabilidade da Natura.
Os resultados começaram a aparecer. Em uma escala que vai de zero a 100 pontos, o IPS local marcou 50 em 2017. Em 2019, após o novo programa, subiu para 58. O índice de 2020 ainda não está disponível.
O incremento na produção de óleo é um exemplo claro de como os investimentos trazem ganho para as empresas. Felipe Pires, coordenador do Programa Território Médio Juruá da Sitawi, conta que a região produziu, em 2018, 1,3 tonelada de óleo, número que subiu para 14 toneladas em 2020. Esse aumento de produção beneficia as famílias extrativistas do local e as associações que beneficiam as sementes. E também ajuda a Natura, que compra o óleo das associações para produzir cosméticos.
A Coca-Cola, por sua vez, buscava desenvolver a cadeia produtiva do açaí na região. No entanto, ao longo do programa e com os dados em mãos, segundo Pires, o interesse da gigante de bebidas mudou, e ela passou a investir em questões ligadas a água e saneamento, também fortemente relacionadas com a produção de bebidas.
Olhar regional
Para um dos coordenadores do Fórum Capitalismo de Stakeholders e do curso de Administração e de Relações Internacionais da ESPM-SP, Marcelo Zorovich, o efetivo interesse das empresas na região envolvida em suas ações socioambientais é importante para determinar se essas ações funcionarão. “Se há interesses da empresa ligados a essas comunidades, há um caso concreto de política sustentável”, afirma.
Zorovich destaca ainda que o fato de o Programa Território Médio Juruá tomar como base um IPS adaptado para as características da região é outro ponto importante. “O IPS deve ser base relevante para planejamento, gestão e avaliação de intervenções pelo País, já que vemos ações do tipo em outras localidades”, comenta Zorovich.
A Natura pretende levar o índice a mais lugares onde atua, como Tapajós, no Pará, e a região do baixo Tocantins. A gerente de sustentabilidade Luciana comenta que o próprio Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) já procurou os desenvolvedores da versão customizada do índice para buscar novas aplicações. No caso do Médio Juruá, jovens das próprias comunidades foram capacitados para trabalhar como entrevistadores da pesquisa, o que também ajuda a gerar renda na região.
O programa chegou ao fim de seu primeiro ciclo em 2020, mas a Sitawi, em parceria com a Natura e a Usaid, já busca apoiadores para o próximo, que tem objetivo ainda mais ambicioso. Uma das metas é a de ampliar o acesso de cerca de 1.200 comunidades à internet. No primeiro ciclo, três já receberam redes, mas o preço ainda é uma barreira. Em algumas localidades, uma hora de navegação chega a custar R$ 15. Ainda não há empresa de telecomunicação parceira nesse projeto.
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