O embaixador da Índia no Brasil, Suresh Reddy, na embaida da Índia em Brasilia, após entrevista ao Poder360. Sérgio Lima/Poder360 08.ago.2022

O embaixador indiano no Brasil, Suresh Reddy, quer ampliar a relação dos 2 países. Diz que o Brasil tem de ser o parceiro estratégico da Índia na América Latina, uma espécie de porta de entrada para este mercado. Em contrapartida, quer que seu país faça o mesmo na Ásia.

Ele chegou ao Brasil em setembro de 2020, em plena pandemia. E já conseguiu deixar a sua marca. O comércio bilateral praticamente dobrou desde a sua chegada. Além disso, duas empresas de defesa brasileiras -a Taurus e a CBC- fizeram joint ventures com pares indianos.

Por aqui, a Mahindra & Mahindra, montadora indiana de tratores, deve anunciar ainda em 2022 a construção de uma nova fábrica no Rio Grande do Sul.

Para esta semana, Reddy organizou uma comitiva de 80 empresários do setor farmacêutico da Índia, tão mencionado durante a pandemia de coronavírus, para fechar parcerias no Brasil. Diz que os países têm que pensar juntos soluções para a saúde pública de hoje em diante.

“Se você olhar os últimos 20 anos, o número de epidemias tem aumentado rapidamente. Ainda nem terminamos com a covid e já temos a varíola dos macacos. E não sabemos o que virá nos próximos 6 meses ou 1 ano. Isso aumenta a necessidade de cooperarmos na área“, disse ele em entrevista ao Poder360 concedida na 2ª feira (08.ago.2022).

Ele destaca, por outro lado, o tamanho do mercado indiano que, segundo ele, está aberto ao Brasil. E os números chamam a atenção pela magnitude: 300 milhões de pessoas na classe média, 600 milhões de usuários de internet e um mercado crescente de turistas querendo viajar depois da pandemia.

“Por que não promovemos produtos brasileiros para essa classe média indiana? É um mercado maior que a maioria dos países do mundo“, disse.

Suresh Reddy tem 53 anos e está no Brasil desde setembro de 2020. Antes, foi embaixador no Iraque e representante da Índia junto aos BRICs.

Como demonstração dos laços que pretende criar com o Brasil, organizou a vinda de uma das maiores embarcações militares da Índia, o Tarkash, ao Brasil para comemorar o aniversário de independência dos 2 países. Em 15 de agosto, a índia comemora 75 anos de independência. Em 7 de setembro, será a vez do Brasil.

Leia trechos da entrevista:

Poder360: Por que a Índia decidiu trazer a embarcação militar Tarkash ao Brasil?
Suresh Reddy: Neste ano, estamos comemorando o 75º aniversário de continentes, estaremos em Bali, Austrália, África e Estados Unidos. O Brasil é muito importante neste momento porque está comemorando 200 anos de Independência, algo igualmente histórico. Esse navio de guerra, chamado Tarkash, chega no Rio no dia 13. E será palco de diversas atividades. No dia da chegada, receberemos estudantes. Quando eles entram, se empolgam. E isso pode despertar interesse em ciências. É isso que queremos incentivar. E também pode aumentar o interesse no funcionamento das Forças Armadas, em fazer parte da Marinha. No dia 14, teremos 2 eventos. De manhã, faremos ioga no navio. A tripulação fará parte do exercício. Acreditamos que a guerra, e o navio de guerra, consequentemente, são sempre o último recurso. Queremos sempre destacar e promover a paz. Por isso a ioga. Das 16h às 17h30, teremos uma apresentação da banda naval. No dia 15, que é o nosso dia da Independência, hastearemos a bandeira ao lado do museu do amanhã, onde estaremos atracados. De noite, faremos uma festa para aproximadamente 100 convidados. 

Quem deve participar? Políticos como o presidente e ministros foram convidados?
Digamos que os líderes do Brasil foram convidados. Nós apreciamos muito a forte relação bilateral dos nossos líderes. Isso simboliza uma forte conexão entre nossos povos. Como governo, naturalmente convidamos ministros e outros representantes. Esperamos que eles possam ir.

Por que o navio ficará ao lado do Museu do Amanhã?
Tem valor simbólico. Estamos construindo uma parceria voltada para o futuro, estamos criando juntos o amanhã. Por isso, avaliamos que era um ótimo lugar para posicionarmos a embarcação e fazermos todos esses eventos. É uma visita histórica, a última foi há décadas. As pessoas talvez não saibam, mas as Marinhas brasileira e indiana têm laços muito fortes. Anualmente, conduzimos os exercícios do IBSAMAR (sigla que em inglês significa Marinhas da Índia, Brasil e África do Sul). São as Marinhas de 3 grandes democracias, e isso nos une. Reflete o fato de que essas democracias também colaboram no campo militar em busca da prosperidade e da paz global promovendo comércio, intercâmbio e países democráticos: promover prosperidade, e isso significa ter águas pacíficas para navegação. Além disso, trocamos experiências sobre como é possível responder a desastres naturais, já que em casos como ciclones, tsunamis e outros eventos, a Marinha é sempre a 1ª a responder.

Falando de economia, como o senhor pretende ampliar a relação entre os 2 países?
Meu maior objetivo é aproximar Brasil e Índia e construir parcerias estratégicas. Essencialmente, estou fazendo conexões entre as pessoas para que haja uma compreensão mútua que leve a relações mais dinâmicas. Brasil é uma terra de oportunidades, um país e uma economia enormes, como a Índia. Mas havia o problema da distância, além da língua, que não permitiu que atingíssemos o potencial de parceria. É aí que eu entro. Estou tentando mostrar as oportunidades do mercado indiano para meus amigos brasileiros e o mesmo para meus amigos indianos. E fico contente que esteja funcionando. Nosso governo liberou investimentos recentemente de US$ 1,6 bilhão no Brasil. E a Mahindra & Mahindra (montadora de tratores) vai construir uma nova fábrica no país que será anunciada em breve (segundo fontes da empresa, será no Estado do Rio Grande do Sul e a construção terá início em 2022). Eles já estão no Brasil, mas podem ampliar muito. São líderes na sua área em muitos países, com boa parcela do mercado. Com essa nova fábrica, vão ampliar a presença no Brasil. Em paralelo, temos duas empresas brasileiras fazendo joint ventures na Índia. Uma é a Taurus, que vai produzir pistolas e rifles na Índia (em parceria com o Jinda Group). A outra é a CBC, especialista em munições (em parceria com a SSS Defence).

Como a Índia tornou-se um mercado atraente para a indústria bélica brasileira?
Há algumas razões. A 1ª é o tamanho do nosso Exército, que é o 2º maior do mundo. Temos pouco mais de 2 milhões de integrantes. Nossas forças de segurança auxiliares tem aproximadamente 1 milhão. Já as policiais estaduais, pouco mais de 1 milhão. São de 4 a 5 milhões de pessoas uniformizadas, é um mercado muito grande. Mas eles não estão olhando só para o mercado indiano. Uma vez lá, eles conseguem atingir um mercado gigante da região. Tem os países do Golfo (de Bengala) e do sudeste asiático. No caso da CBC, é o que está em curso. Eles já receberam pedidos de munição do Nepal. Os custos de logística caem drasticamente se a venda é feita por uma indústria brasileira instalada na Índia. Os desafios da distância e da língua desaparecem. Essas duas empresas entenderam esse contexto e estão construindo oportunidades. 

E o que significa para a Índia a ida dessas empresas ao país?
Essas empresas brasileiras desenvolveram uma tecnologia impressionante no setor de defesa. E a Índia é um mundo de oportunidades para a tecnologia, assim como o Brasil. Nesse sentido, estou contente em anunciar que na 4ª feira (10.ago.2022) chegará ao Brasil uma delegação de 80 empresas farmacêuticas indianas para reuniões e conversas em São Paulo. Mais de 100 empresas brasileiras demonstraram interesse em encontrá-los e fazer negócios. Saúde é uma área estratégica para parcerias. As pessoas acham que é um mercado, mas não é. Há duas questões importantes. A 1ª é que os desafios da saúde só aumentam e os governos têm que cuidar das pessoas. A 2ª é que temos um aumento na frequência das pandemias. Se você olhar os últimos 20 anos, o número de epidemias tem aumentado rapidamente. Ainda nem terminamos com a covid e já temos a varíola dos macacos. E não sabemos o que virá nos próximos 6 meses ou 1 ano. Isso aumenta a necessidade de cooperarmos na área. E a Índia é famosa como a “farmácia do mundo”. Responde por mais de 60% da demanda global de vacinas. Segundo a OMS (Organização Mundial da Saúde), é o maior provedor de vacinas e medicamentos do globo. Há imensas possibilidades de parcerias. É o que estamos tentando construir. Olhamos para o Brasil como um parceiro, não como um mercado. A mensagem de hoje é: nossas companhias estão felizes com a recepção brasileira e estão vindo em busca de novas parcerias.

E qual o maior desafio para torná-las uma realidade?
É a falta de entendimento um do outro. As pessoas ainda olham para a Índia como um país distante, pobre e subdesenvolvido. Sim, nós temos milhões de pessoas cujas condições sociais têm que melhorar. Mas ao mesmo tempo, há 2 fatores relevantes. Um é que hoje a Índia é o país com o maior número de empresas farmacêuticas aprovadas pelo FDA (equivalente à Anvisa norte-americana) e pela União Europeia. A setor. Em 2º lugar, a classe média indiana é composta por 300 milhões de pessoas com potencial de compra elevado. Então, por que não promovemos produtos brasileiros para essa classe média indiana? É um mercado maior que a maioria dos países do mundo.

E qual a forma de dissolver essas barreiras? 

Com o e-commerce, vender para a Índia tornou-se muito mais fácil. No passado, você precisava ir aos locais. Hoje, não mais. Temos as plataformas digitais. Temos 600 milhões de pessoas usando a internet na Índia e mais de 900 milhões de smartphones ativos. Esse é o tamanho do mercado que o Brasil pode penetrar. E eu digo exatamente o mesmo para os meus pares indianos. Olhem para o Brasil. 

Mas mesmo com as plataformas, essa missão está vindo ao Brasil.
Quando você visita um país, compreende melhor a sua realidade. Por isso, insistimos que as pessoas viajem livremente entre Brasil e Índia. O visto para brasileiros pode ser tirado pela internet. Basta pegar uma xícara de café e, antes de ela terminar, o visto estará pronto. Quando os indianos chegam no Brasil, eles percebem como são parecidos com os brasileiros. Graças ao crescimento econômico e da classe média, a Índia também tem ampliado o número de indianos visitando outros países, que têm se esforçado para atrair esses turistas. Eles gastam muito e são uma multidão. Uma série de países estão abrindo escritórios de turismo para atrair indianos. Quero o Brasil nesse circuito. Vou te dar um exemplo. O mercado de casamentos na Índia movimenta US$ 44 bilhões anuais. Muitos indianos vão para a Tailândia, Bali, Turquia, México, Grécia para se casarem. E o gasto médio é superior a US$ 1 milhão. Minha questão é: por que o Brasil não é parte disso? Imagina um casamento no Rio ou nos Lençóis Maranhenses? Seria inesquecível.

Fonte: https://www.poder360.com.br/internacional/india-quer-parceria-farmaceutica-com-brasil-diz-embaixador/

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