A pandemia trouxe mudança de hábitos ao mundo inteiro, principalmente em relação à saúde. No Brasil, além dos cuidados com a higiene, os brasileiros começaram a consumir mais medicamentos para transtornos do sono, depressão, ansiedade e complexos vitamínicos para melhorar a imunidade. E deixaram nas prateleiras das farmácias os antigripais e anti-inflamatórios. Em função dessa mudança de mix nos pontos de vendas, no primeiro semestre deste ano o mercado farmacêutico no país apresentou crescimento de 16,4% no faturamento. Já em volume a expansão foi de apenas 2,7%.
A receita foi de R$ 36,74 bilhões no período em 2020 para R$ 42,75 bilhões neste ano. Em volume foram comercializados 2,42 bilhões de unidades de janeiro a junho deste ano, ante 2,36 bilhões na mesma base de comparação em 2020.
Com demanda em alta, alguns medicamentos tiveram os descontos reduzidos e isso ajudou a elevar o resultado
As classes de medicamentos mais consumidas, segundo o presidente executivo do Sindicato da Indústria de Produtos Farmacêuticos (Sindusfarma), Nelson Mussolini, têm um ticket médio mais alto e isso explica essa alta do faturamento do setor. “Essa elevação na receita do setor não ocorreu por causa do reajuste de medicamentos que aconteceu em abril. Até porque não deu tempo de absorver esse aumento na ponta, há muito estoque. Foi a mudança do mix de produtos e são mais caros. Todos os relacionados à pandemia tiveram vendas expressivas.”
De acordo com dados do Sindusfarma, a receita com a venda de vitaminas cresceu 35,02%, anti-inflamatório aumentou 17,13%, medicamentos para o aparelho digestivo e metabolismo outros 16,49% e para o sistema nervoso central apresentou alta de 18,73%.
Para Fernando de Castro Marques, presidente da União Química, a venda de medicamentos para tratamentos de doenças decorrente da covid-19 foram um dos impulsionadores do crescimento do faturamento do mercado. Segundo ele, no segmento de vitaminas, por exemplo, o ticket médio é de R$ 40 a R$ 60, bem acima dos antigripais e anti-inflamatórios que eram os campeões de vendas antes da pandemia. “A venda de vitamina D cresceu muito nesse período. Na União Química tivemos alta em todas as divisões em que atuamos no período”, afirmou.
Para 2021, a estimativa da companhia é atingir faturamento de R$ 4 bilhões, crescimento de 24% no comparativo com 2020. Em doze meses, terminados em junho, a alta na receita é de 28,5%.
O presidente da farmacêutica indiana, Lupin MedQuímica, Alexandre França, disse que, além da mudança de mix de consumo, ocorreu no semestre outro fenômeno: a redução de descontos nos medicamentos, principalmente para os produtos com alguma relação com a covid-19. Segundo ele, há casos do genérico do antibiótico azitromicina com a diminuição dos descontos para os distribuidores em até cinco pontos percentuais.
“Há uma demanda natural por esse produto e não há porque reduzir o preço para ganhar mercado. Uma situação impensável no segmento de genéricos. Azitromicina talvez tenha sido o genérico que mais deu dinheiro nesse período”, disse França.
A Lupin MedQuímica, conforme o executivo, tem em seu portfólio 150 medicamentos, dentre eles o genérico da azitromicina. A receita com a venda desse produto triplicou no primeiro semestre. “Zolpidem, para o tratamento de insônia, também apresentou evolução importante. Todos os medicamentos usados no tratamento para a covid-19 ou nas consequências da pandemia tiveram ganhos importantes”, afirmou França. A companhia fechou o primeiro semestre com faturamento de R$ 141 milhões e a expectativa é de receita de R$ 250 milhões no ano.
Na Cimed a venda de vitaminas apresentou crescimento de 27%, chegando a R$ 300 milhões no primeiro semestre. Isso, segundo o presidente da companhia, João Adibe, em função da mudança de comportamento do brasileiro, que viu nos complexos vitamínicos uma alternativa para aumentar a imunidade.
“Nosso faturamento cresceu 25% no primeiro semestre e algumas categorias, além das vitaminas, sustentaram essa alta. Em OTC (medicamentos isentos de prescrição) tivemos aumento de 12% e outros 17% em genéricos”, disse.
Segundo Adibe, outra alavanca do crescimento da Cimed foram os lançamentos de vitaminas no semestre. A companhia apresentou 23 produtos dos 46 previstos para este ano, sendo boa parte em vitaminas. “A nossa estimativa é de faturamento de R$ 2,4 bilhões neste ano, sendo que a categoria de complexos vitamínicos deverá gerar entre R$ 500 milhões a R$ 600 milhões.”
Apesar da mudança de mix e diminuição dos descontos, o segmento de genéricos segue representando 35,5% do volume comercializado no primeiro semestre. Foram vendidas 862,10 milhões de unidades, alta de 6,5% no comparativo com o mesmo período do ano passado. Em receita, no entanto, o segmento tem pouca representatividade. O faturamento de janeiro a junho foi de R$ 6,87 bilhões, evolução de 25% e participação no mercado total de 16,1%.
Mussolini, do Sindusfarma, pondera, no entanto, que o bom resultado do mercado farmacêutico no período não se reflete na melhora das margens das empresas. “As pessoas confundem. Faturamento não é lucro. Os custos do setor comprimem as margens e em alguns produtos, são até negativas”, afirmou Mussolini.
Segundo ele, somente os gastos com embalagem subiram cerca de 50%, a energia outros 38% e o dissídio coletivo deste ano foi de 7%. “O dólar caiu, mas continua em torno de R$ 5 a R$ 5,20 e pressiona muito os preços de matéria-prima, que é 95% importada. Além disso, os fretes internacionais, que imaginávamos que reduziriam com a volta da economia mundial, permanecem extremamente altos. Em alguns casos, em algumas rotas, chegou a triplicar”, afirmou Mussolini.
Alguns medicamentos, de acordo com o dirigente, sofrem mais com esse aumento de custos. A categoria de antibiótico, conforme Mussolini, teve as suas margens mais pressionadas no período. “Produtos de uso contínuo geralmente sofrem mais quando há uma crise de insumo. Para se ter uma ideia, os custos em dólar subiram de 25% a 30% no primeiro semestre deste ano.”
O dirigente ressaltou, ainda, que o Estado de São Paulo elevou a carga tributária neste ano. A Fazenda paulista começou a cobrar 18% de Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) de medicamentos oncológicos. “Eram isentos e agora é incidido essa alíquota. Isso aumenta os custos e diminui as margens do setor. Somente esse novo imposto anula praticamente a alta na receita do mercado farmacêutico”, afirmou o presidente do Sindusfarma.
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