Preços baixos e umidificadores de cabelo comandaram por um longo tempo a indústria de cosméticos da Bahia. Entretanto, com a mudança no cenário, uma reinvenção tornou-se mais do que necessária por parte das empresas locais

A Bahia já teve a indústria de beleza mais pujante do Nordeste, mas a dependência de boa parte das empresas locais de um único produto, o umidificador de cabelos – que, como o nome diz, deixa as madeixas com aspecto de cabelo molhado com o volume e os cachos controlados – as deixou vulneráveis. Quando a onda da valorização da beleza natural dos cabelos cacheados e crespos chegou com tudo, muitos nomes tradicionais do estado foram surpreendidos com uma brusca queda nas vendas. O movimento foi turbinado pela crise econômica que ainda assola o Brasil e foi mais sentida no Nordeste, justamente a região que mais se beneficiou do crescimento anabolizado entre o final do segundo mandato de Lula e o primeiro de Dilma Rousseff.

Quem mais sentiu esse impacto foi, justamente, a antiga “nova classe média”, que puxou o crescimento no período e sempre foi o público consumidor primário das marcas de cosméticos baiana. Enquanto gastava o que tinha e o que não tinha, esses consumidores elevaram o seu padrão de consumo, incorporando produtos de marcas mais sofisticada e que se propunham a entregar resultados superiores. Em paralelo a essa sofisticação do consumo, um movimento começava a ganhar força nos blogs e redes sociais, com impacto direto sobre o produto cosmético mais emblemático do estado: a valorização e a afirmação dos cachos. E foi aí que muitas indústrias tradicionais do setor “dormiram no ponto”. Na visão de Ivan Castro, representante comercial da Isan, casa de fragrâncias paulista, a Bahia já teve uma grande importância para faturamento regional da casa. Segundo ele, o estado foi perdendo espaço na região, sobretudo para Pernambuco. Porém, crê que somente agora as empresas locais estejam procurando correr atrás do prejuízo. “Agora está todo mundo querendo trabalhar produto de valor agregado, mexendo em formulação, embalagem, roupagem nova, para trabalhar com este tipo de produto”, relata Ivan.

Tanto quanto a crise, foi a concorrência de empresas mais antenadas com os novos anseios das consumidoras o que mais contribuiu para a derrocada nas vendas de muitas empresas locais, na maioria dos casos, queda entre 10% e 15% de 2015 para 2016. Muitos empresários tratam a “invasão” de marcas com produtos para as cacheadas a partir do último ano, especialmente Lola e Salon Line, como o momento de grande derrocada da indústria local. “Nesses últimos 20 anos, a mudança do perfil de consumo ficou muito clara. Saímos de uma coisa muito popular, muito restrita. Hoje, o público é mais exigente e não se importa de pagar mais caro. Mesmo quem não tem tanto dinheiro. Até porque, ainda existe a facilidade do cartão. Tenho uma cliente, que nós sabemos que não é abastada, mas que saiu da loja com mais de R$ 500 em produtos da Lola para ela e as duas filhas. E ela dividiu em seis vezes”, conta Alynne Santo, gerente de Atendimento da Bel Salvador, a maior rede de perfumaria da Bahia, num exemplo que sintetiza bem o tamanho do problema para as indústrias locais.
Se você chegou até aqui, pode estar imaginando que a indústria baiana foi nocauteada. Não é bem assim. Até porque existem alguns grandes competidores nesse grupo, dos quais trataremos mais à frente. Mas, considerando o quadro geral, podemos considerar uma derrota sim, por pontos. Só que é uma derrota daquelas que serve para mostrar que não se pode viver das glórias do passado. E não existe estado no qual o setor de beleza ficou tão “inebriado” pelo sucesso – que, quando ele se foi, pouca gente se deu conta – como a Bahia.

A maldição do “ouro branco”
Para entender o estado atual da indústria de cosméticos da Bahia é preciso voltar cerca de duas décadas no tempo. Em meados dos anos 1990, o mercado de cuidados com os cabelos afro, embora pequeno, estava em ascensão, com as pessoas buscando os salões especializados para realizar procedimentos como o relaxamento e o permanente afro, que se propunham a ?domar? os cabelos crespos. Uma das marcas mais cultuadas pelos profissionais e consumidores à época era a Soft Sheen (hoje no portfólio da L?Oréal), uma das marcas norte-americanas que chegaram ao Brasil para tentar estabelecer o mercado de cosméticos para os cabelos afro.

Com o sucesso da linha somada à burocracia brasileira, faltou produto no mercado. A Soft Sheen tinha um produto usado na manutenção do cabelo, um creme sem enxágue de manutenção que ajudava a manter o visual do tratamento. Foi quando Luiz Cabeleireiro, dono de um salão próximo ao Elevador Lacerda, no centro antigo de Salvador, na curiosidade (e na necessidade) de encontrar um solução para a falta de produto, começou a fazer em casa, no seu liquidificador, testes com várias fórmulas para chegar num creme que substituísse o da marca americana. “Eu também era cabeleireiro na época e ele me chamou para uma parceria. E foi assim que desenvolvemos o primeiro creme umidificante do Brasil”, lembra TJ, sócio da Ouais Cosméticos e um dos pioneiros da indústria baiana.

O umidificante (ou umidificador) inventado na Bahia, com a marca Umidifica, era fabricado de forma caseira, com um liquidificador de 15 quilos operado manualmente. “Chegamos a vender mais de 100 mil peças desse produto por mês, só para salões de beleza. Foi uma febre”, conta TJ. O sucesso levou o varejo a procurar pelo produto, o que levou alguns salões a vendê-los para abastecer as lojas e aí o produto realmente explodiu. E, logo em seguida, começaram a tentar imitar o Umidifica. “Foi quando o mercado abriu os olhos e tivemos de buscar uma terceirizadora. Aí, um foi copiando o outro e surgiram um monte de outras marcas, mas tudo na raiz do Umidifica”, reforça o empresário. As empresas baianas com mais de 15 anos de vida e que operam no varejo, praticamente nasceram em cima dos umidificadores. Foi a fonte de renda de todo mundo, mesmo em empresas com outros produtos, por muito tempo esse item representou cerca de 70% 80% do negócio deles.

O umidificador de cabelos fez a fortuna de muitos empresários do setor. Só que, inebriados pelo sucesso, as empresas ficaram amarradas a esse produto. “Me incomodava muito a questão do umidificante. Ficou todo mundo cego, não tinha a percepção. Com o capital que foi acumulado durante anos, poderiam ter se preparado para o futuro”, acredita Raul Menezes, presidente do SINDICOSMETIC, o sindicato das indústrias cosméticos na Bahia e sócio da Decreina, marca que atua no segmento de cuidados com os pés. Para o dirigente, as empresas poderiam ter usado a abertura que o umidificador deu para eles para com a oferta de outros itens. “Algumas empresas fizeram isso, mas foram poucas. Começamos na frente, mas hoje estamos perdendo em dinamismo para a indústria de Pernambuco e Ceará.”

E como se já não bastasse, o umidificante é um produto que está na contramão do mercado. Ele representa a antítese do que as cacheadas buscam e, por isso mesmo, tem sido preterido pelas consumidoras, especialmente as mais jovens que estão em busca de produtos mais leves, com ingredientes menos agressivos e que valorizem os cachos, dando-lhes um aspecto natural. E, detalhe, em geral, elas não se importam de pagar bem mais para levar pra casa esses produtos mais modernos.

Por que as empresas da Bahia, que já eram próximas das crespas e cacheadas, demoraram tanto para atentar a essa mudança de espírito das consumidoras? Para Jeane Rocha, diretora da Ouais, as empresas baianas, em sua maioria, não têm um trabalho estruturado de marketing e pesquisa para estudar o que está acontecendo de tendência no Brasil e no mundo. ?Essa movimentação das blogueiras, de gente que queria valorizar a sua beleza natural – meninas que queriam se afirmar como elas mesmas, sem precisar alisar os cabelos – ficou muito forte. E as empresas que perceberam isso, foram na frente, tiveram esse feeling e se associaram a essas blogueiras. As consumidoras daqui, com certeza absoluta foram influenciadas por essa mídia sim?, conta a empresária.

Fazendo a diferença
Mas é importante ressaltar que a indústria cosmética baiana vive, neste momento, um esforço para se reinventar, abandonando paradigmas que fizeram o sucesso da indústria lá atrás, mas que não são suficientes para alçá-las a lugar de destaque no cenário atual.

Existem 92 empresas de cosméticos autorizadas a operar na Bahia, de acordo com a Anvisa. Fontes locais acreditam que, no máximo, 60 empresas operem de fato no mercado local. A receita estimada para os vendas de cosméticos da Bahia reside na cada dos R$ 250 milhões (número que não considera as operações de fabricação e distribuição que o Grupo Boticário mantem no estado).

O processo de reinvenção é puxado por algumas poucas empresas que romperam com os padrões da indústria local, tanto na questão do umidificante, como mais importante, não terem se tornado reféns de outra armadilha bastante comum às empresas da região, a de só querer se diferenciar pelo preço. São marcas que optaram por competir com produtos mais bem formulados, com posicionamento de preço e distribuição coerentes à proposta da marca. Afinal, não dá para fazer um produto posicionado numa faixa superior de mercado, sem garantir que ele cumpra a promessa. E, para cumprir a promessa, não dá para querer cobrar por ele o preço de um produto popular. A conta não vai fechar nunca.

As duas maiores empresas do estado são a Avatim, sediada em Ilhéus, no litoral baiano e a E-Cosmetics Salon, baseada em Teixeira de Freitas, no sul do estado, bem próximo da fronteira com Minas Gerais. Além do fato de estarem bastante distante da capital, as duas empresas operam negócios bastante distintos entre si, e que pouco tem a ver com a formação, digamos, mais clássica, das empresas de cosméticos da Bahia.

A Avatim foi criada em 2000 e foi pioneira no negócio de marketing olfativo e perfumação de ambientes. O negócio que no final da década passada passou a incorporar produtos para o corpo, desde então vem evoluindo fortemente e direcionando a Avatim muito mais como uma empresa de cosméticos. Hoje, os produtos de perfumaria, higiene pessoal e cosmético já respondem por metade das vendas da rede de cerca de 80 lojas da empresa, que opera no sistema de franquia. (a Avatim será abordado na próxima edição da revista).

Já a E-Cosmetics Salon opera no mercado salões de beleza e tem o seu negócio fortemente baseado em treinamento e formação de profissionais. Criada em 2002 por Edson José Borgo, a marca oferece um portfólio de mais 300 itens, todos voltados para o uso em salões de beleza. Mais recentemente, a companhia apresentou sua marca de consumo, a Sol Beauty Care, com diversos produtos para os cabelos e a pele do corpo.

Ambas as empresas têm vendas estimadas pelo mercado entre R$ 40 milhões e R$ 50 milhões anuais. São pouquíssimas as empresas no estado que detêm um faturamento mais substancial, acima dos 10 milhões ao ano. Só que no atual cenário da indústria local, mais importante do que o volume de faturamento é a capacidade de as empresas locais se adequarem a uma nova realidade. Também são poucas as que já se destacam nesse sentido, caso do Aromarketing, dona da marca de perfumes para ambientes Aquaroma (que, assim como a Avatim vai ilustrar uma reportagem na próxima edição de Atualidade Cosmética); da novata Amávia e da tradicional TriHair, as duas últimas no segmento de cabelos. A Aromarketing tem consciência de que o mercado de aromatização de ambientes é recente, sendo assim crê existir um enorme potencial ainda para o segmento. “Entre os consumidores, temos uma fatia pequena de experts, mas que está crescendo; uma fatia de gente que adentrou o mercado e começa a usar e, uma terceira, que é a maior fatia: a de quem não usa. O potencial é muito grande”, vislumbra Naiana Pedreira, sócia e diretora Comercia da Aromarketing, que revela que o objetivo da empresa é abrir 70 unidades até 2022, via sistema de franquias.

Com pouco mais de cinco anos de vida, a Amávia é tida como uma referência no processo de renovação da indústria baiana de produtos para os cabelos, principalmente por conta do seu posicionamento distinto no mercado local. Para isso, Carlos Nunes, sócio e responsável pela operação comercial da companhia, se valeu da sua experiência de 15 anos atuando na linha de frente do negócio, como distribuidor de marcas baianas no Rio de Janeiro. A ideia de montar o próprio negócio veio da falta de sintonia das indústrias locais que ele distribuía para atender a certas demandas que o mercado gerava. “Fui sempre o maior distribuidor nacional de todas as empresas pelas quais passei. E a gente queria mais, queríamos atender às necessidade do nosso cliente”, lembra o empresário, que afirma que faz na Amávia, exatamente o que pedia aos fabricantes quando era distribuidor. A empresa está presente em 18 estados, por meio de 27 distribuidores exclusivos. Na Bahia, único estado atendido diretamente pela própria empresa, a marca está presente em cerca de 600 pontos de venda especializados.
O negócio foi lançado simultaneamente no Rio e na Bahia e, pela experiência de Carlos no mercado, nos primeiros 18 meses foi o Rio que sustentou o negócio da empresa. Mas depois desse período, a Bahia superou e hoje ainda é o maior mercado da companhia. Aliás, essa é uma característica importante. O mercado local é também o principal para a maior parte das empresas.

Posicionada como uma marca premium, a Amávia conta com 180 funcionários e é hoje, a maior companhia de cosméticos da Bahia a operar no varejo multimarcas. O público-alvo da empresa é um consumidor das classes B e C+. “É um consumidor sensível à qualidade e à apresentação do produto, ao posicionamento, não quer um produto popular, que seja encontrado em todo lugar”, explica Carlos. Para gerar experimentação dos produtos e construir a reputação da marca, a empresa investe muito em promoção no PDV e, principalmente, em amostras. No ano passado foram distribuídas mais de 12 milhões de miniaturas dos produtos da empresa.

O portfólio de mais de 100 itens é quase equitativamente dividido entre produtos de cuidados com os cabelos de todos os tipos e colorações. No próximo ano, a empresa deve assistir a um forte avanço na categoria de coloração, quando a fábrica da empresa para a categoria, a primeira de uma empresa do Norte/Nordeste e das pouco mais de 20 unidades de produção destinadas a produtos do gênero, vai estar a todo o vapor. Na verdade, até o final deste ano, as vendas de coloração já devem responder por entre 25% e 30% do total. As tinturas da Amávia são vendidas na faixa dos R$ 24. Umidificadores no portfólio? Claro que sim. São dois itens que representam tanto em vendas quanto qualquer outro item da linha. “Não entramos nessa briga. Também não estamos em mercearias, supermercados ou farmácias. Nosso canal são as lojas especializadas”, diz.

Mas a empresa tem feito movimentos ousados na direção de outros canais de distribuição. O mais consolidado deles são os quiosques em shoppings. Atualmente são 25 deles em vários estados. É com esse formato que a Amávia vai estabelecer o modelo de franquias, um projeto que está sendo desenvolvido há mais de um ano com a ajuda de uma consultoria especializada em franchising. Atualmente, esse formato representa cerca de 15% do negócio. Até o final do próximo ano, o objetivo é alcançar as 100 unidades, atingindo cerca de 40% das vendas totais da companhia. Some-se a essa empreitada multicanal, também, uma com a venda direta via catálogo, no mais clássico estilo Avon, só que com produtos da Amávia. O projeto já está rodando em Salvador e, de acordo com o diretor, tem ajudado a marca a acessar um público que ainda é muito acostumado a comprar no porta a porta, Ele garante que não tem enfrentado conflito entre os diferentes canais na capital baiana até o momento, onde todos os formatos rodam simultaneamente.

Fugindo da armadilha
Ao contrário da Amávia, que já nasceu num contexto de mercado mais moderno, a TriHair foi criada na esteira do sucesso dos umidificadores. Mas, o que fez com que a TriHair chegasse hoje ao mercado melhor posicionada do que as dezenas de companhias que surgiram naquele momento é que ela foi uma das primeiras, se não a primeira, a entender que precisaria encontrar um caminho que não dependesse exclusivamente da venda dos umidificadores, e isso bem lá atrás. Foi o nascimento da linha 12 Ervas, há quase 18 anos. “Queríamos entrar no mercado com algo diferente do umidificador. Só que das empresas que tinham começado antes da gente, tentaram lançar linhas de shampoo, condicionador, hidratação e nada vingava. O pessoal só conseguia vender o umidificante”, lembra Adriano Brito, presidente da TriHair, que diz que a empresa foi pioneira na indústria local em ter no portfólio outros produtos que vendiam, além do umidificador.

O empresário credita o sucesso inicial do produto a uma visão que, só agora, muitas das suas antigas concorrentes estão enxergando. Ter encontrado um espaço claro para explorar. “Você ia à prateleira e 95% dos shampoos ofereciam a mesma coisa. Só 5% propunham um tratamento diferente. E eu preferi ficar no tratamento, mesmo sendo um mercado bem menor?, conta o dono da TriHair. O shampoo 12 Ervas foi lançado como um shampoo de tratamento, que previne contra a queda, contra a caspa e está baseado em 12 ervas, algumas das quais do próprio Nordeste. A aceitação foi grande. A TriHair conseguiu substituir a venda do umidificador por um mix de produtos. Adriano se orgulha de que, pouco mais de um ano após ter sido lançado, dermatologistas estavam indicando o produto para tratamento. ?A gente ficava maravilhado”, conta. “Depois de 12 Ervas, eu não quis vender mais produtos para lavar o cabelo. Iríamos fazer apenas produtos para tratar os cabelos. E tem de dar resultado, custe o que custar. Shampoos de tratamento tem de custar mais caro.”

Com o sucesso do 12 Ervas e a visão de atuar no segmento de tratamento, Adriano logo pensou numa nova marca que alçasse a empresa a um novo patamar. Enquanto a linha TriHair, original da marca, vendia o shampoo por R$ 2,50, o 12 Ervas, relançado como Biovegetais, custava R$ 3,95. A diferença era grande, mas o padrão, a embalagem, o conceito, eram outros, tudo era muito bom. “As pessoas olhavam e sabiam que valia o preço que cobrávamos”, pontua. Numa decisão corajosa (mas sensata), o empresário também foi reavaliando a participação da empresa em grandes redes de varejo, que geravam altos volumes de vendas, mas não eram sustentáveis para a TriHair.
Mais recentemente, com o lançamento da linha Lanox, de tratamentos especializados, a companhia se viu inserida em um novo contexto de mercado. A Biovegetais sempre operou em todos os canais de venda – do alimentar até nos salões. A marca está presente em cerca de 10 mil pontos de venda. Dois mil deles apenas na região metropolitana de Salvador. Já a Lanox é bem mais restritiva. A marca surgiu para acompanhar a movimentação das consumidoras por produtos que oferecessem mais performance. “Fomos buscar tratamentos diferentes com produtos para lojas especializados. A Lanox não é vendida no canal alimentar. É um produto de alto nível com trabalho no ponto de venda com promoção e promotoras para fazer a venda dos produtos”, afirma Adriano.

Com a crise, a participação da Lanox no balanço das vendas, que nos últimos anos era de 52%, perdeu espaço para a mais acessível Biovegetais, que hoje representa 55% do faturamento da companhia. A Bahia é o maior mercado da TriHair, que opera por meio de uma rede de distribuidores em cerca de 10 estados.

Correndo atrás
A Ouais, empresa que TJ estabeleceu em 2001, carrega a herança e o DNA do umidificador. Sua principal marca, a Hummidus, foi criada como uma segunda marca na época em que o empresário era sócio de Luiz Cabeleireiro na Umidifica. Depois da marca original, era a segunda marca mais vendida do mercado. Quando a sociedade foi desfeita, no processo, ele ficou com a marca Hummidus. A empresa conta hoje com mais outras cinco marcas, mas a principal ainda responde por 65% das vendas da empresa. A dependência do umidificador, embora venha caindo ano após ano, ainda é bem relevante. 45% das vendas da empresa, considerando todas as marcas, são geradas pelos umidificadores.

A Ouais é uma das empresas tradicionais do mercado que foi diretamente atingida pelas mudanças de hábitos e a concorrência das linhas de cachos. E tem trabalhado para reenergizar o negócio com iniciativas em diferentes frentes. Uma delas é o lançamento de uma nova linha com 15 itens, dentro da marca Hummidus durante a Beauty Fair. O lançamento vai explorar o conceito do cronograma capilar, mas oferecendo uma linha completa.

Para Jeane Rocha, diretora da empresa, ao menos neste momento, os produtos que estão tendo o maior giro nas gôndolas são os de menor valor. “Isso nos levou a fazer essa movimentação e retomar os investimentos na Hummidus, por ser uma linha de preço mais acessível”, acredita. Isso porque, nos últimos anos, a Ouais vinha centrando mais esforços na sua marca premium, a Nutrikell, com shampoos vendidos na faixa dos R$ 25 (500 ml), três vezes mais que o valor cobrado pelo mesmo item na marca Hummidus. “A Nutrikell é uma marca que se sai muito bem na loja especializada, com um trabalho de venda assistida”, conta Jeane, que diz que, embora o desembolso seja alto, o produto entrega o resultado. A participação da marca vem crescendo ano após ano no mix de vendas da Ouais, apesar do fato de os distribuidores serem os mesmos para as duas marcas, torna o processo de venda da linha premium mais difícil. A empresa avalia o modelo, uma vez que são perfis de negócios muito diferentes para cada uma.

Embora tenha presença em vários estados no Nordeste e do Sudeste, o grande mercado da Ouais é a Bahia. E, o fato de operar principalmente com o pequeno varejo independente, tem feito os dias ligeiramente mais complicados. “Nosso tipo de cliente trabalha no caixa do dia a dia. Eles escutam muito o que é falado na mídia, deixam de comprar se veem notícias ruins. Acho que no ano que vem voltaremos a ter condições de recuperar o mercado que perdemos”, pontua a diretora da Ouais.

A empresa pretende fortalecer a linha de finalizadores para cabelos crespos e cacheados, mercados nos quais a Ouais já tem presença forte, e oferecer produtos para o tratamento de outros tipos de cabelos. “O forte nosso, queira ou não queira, são os finalizadores. Mas são outros tipos que nós podemos construir e que grandes empresas ainda não têm no portfólio. Temos vários tratamentos, mas ainda não vendemos o volume que gostaríamos que fosse” explica TJ. Na esfera comercial, o presidente da Ouais aponta planos de expansão para o futuro, incluindo aí a abertura de quiosques próprios da empresa.

A Cads, atual detentora da marca Umidifica, também vem buscando trilhar caminhos diferentes para tracionar o crescimento do negócio, também bastante dependente do mercado de umidificadores. Para Gece Macedo, diretor da empresa, a indústria local não pode ir só a reboque das empresas de outros estados. “Precisamos criar novidades também para um público que sempre, em sua maioria, foi das nossas empresas e que conhecemos bem”, afirma o executivo. Apesar disso, para 2018, as baterias da empresa devem se voltar para o segmento de pele, com o investimento em novos produtos Dermocosméticos, “É um mercado exigente, com público esclarecido e produtos de alto valor agregado”, reforça Gece.

Nivelando por cima
Com 14 lojas no estado e outras 10 fora (e contando), a Bel Salvador é uma das maiores bandeiras de perfumaria do Brasil. A rede foi pioneira ao estabelecer suas lojas em shoppings centers. Isso ajudou a Bel a moldar o padrão do mercado na capital Salvador, onde está presente nos principais shoppings. Mas também impõe à empresa custos de operação bem mais elevados. “Para manter uma loja no shopping, já parto de um custo de condomínio e aluguel de quase R$ 100 mil. É uma operação cara e tenho de considerar isso na hora de aplicar as margens sobre os produtos que vendemos, para termos condições de bancar a operação”, explica Luciano Rodrigues, gerente-geral da varejista e responsável pela expansão da operação.

Essa questão do preço – da manutenção de uma política de preços, na verdade – tornou o relacionamento comercial da Bel Salvador com boa parte das marcas locais, menos intensa. O executivo da varejista explica que a maioria das empresas da região de Salvador e Lauro de Freitas (base para a maior parte dos fabricantes de cosméticos do estado) já estiveram nas prateleiras da Bel Salvador: Humidus, Fio Restore, Umidifica e Amávia, por exemplo. “Por que não trabalhamos mais com muitas dessas indústrias locais? Eles enxergam a Bel como uma vitrine. Só que eles acertam um preço de venda comigo; depois para o João, vendem com outro preço; depois para Maria, na outra esquina, com outro preço. Só que o João e a Maria não carregam toda a estrutura que eu carrego. As indústrias daqui não entendem o nosso custo. Não conseguem entender que o preço final que eu vendo e que o João, e que a Maria, vendem precisa ser mais ou menos equivalente. E, para isso, a indústria precisa vender para esses diferentes perfis de lojistas com preços que considerem essa dinâmica. E isso não acontece. Aí, o cliente do bairro, quando vai ao shopping e vê o produto na Bel Salvador mais caro, ele acaba achando que nós somos careiros. Por isso não trabalhamos mais com essas marcas”, lamenta Luciano, que reforça que existem hoje muitos produtos locais com bastante qualidade e que isso não é um problema.

O púbico da Bel Salvador pode ser mais exigente do que a média do mercado, mas ele representa bem a massa de consumo de cosméticos na região. “Nós atendemos muito bem todo mundo: do povão ao AAA”, acredita Luciano. A Bel Salvador é uma das redes que melhor trabalha o conceito de exclusividade na distribuição, buscando manter no mix de produtos um bom número de marcas que só poderão ser encontradas nas lojas da rede, agregando valor ao negócio.

Na linha de frente do atendimento às consumidoras da rede, Allyne Santos, diz que as clientes querem encontrar nas lojas marcas e produtos que estejam bombando na internet, linhas ao qual eles não têm muito fácil acesso. “E é isso o que a gente traz”, garante a supervisora. Sobre o fato de as marcas locais não terem tanta força junto às clientes da rede, ela acredita que um dos problemas, como já mencionado no início desta reportagem, é que muitas indústrias não se atualizaram. “As consumidoras não querem mais os produtos com parabenos, com nenhum derivado de petróleo, com óleo mineral… Nosso público tem mais conhecimento do produto, o que faz com que não aceite mais esse tipo de produto. Elas ficam com um pé atrás (em relação às marcas locais) e quem tem trazido produtos assim são as marcas de fora da Bahia”, diz ela.

A percepção de Aline é corroborada pelo presidente do SINDICOSMETIC, para quem as indústrias locais, historicamente, não dedicaram a devida atenção para construir a identidade das suas marcas junto aos consumidores, algo que é determinante para o sucesso nos dias atuais. “Se as indústrias locais tivessem investido em construção de imagem e marca, hoje, certamente os consumidores estariam cobrando por essas marcas nas lojas. E elas iriam comprar e expor esses produtos para atender suas clientes”, reforça Raul.

A Bel Salvador está em modo de expansão acelerada. Mas ela deve se dar mais fora da Bahia. A varejista olha para alguns polos de consumo dentro do estado. Mas a Bel, seguindo uma máxima do seu controlador, não vai para cidades nas quais amigos deles já possuem operação. “Ele tem um respeito muito grande pelos outros e não vai para as praças onde ele tem amigos lojistas. É um principio que norteia e limita a expansão no estado”, revela o gerente-geral da Bel, que reforça que, independentemente disso, o plano da rede é o de avançar mais fora do estado mesmo.

Achando um novo espaço
“É muito complicado convencer um lojista a introduzir uma marca nova hoje”, acredita Kelly Lima, diretora da Amazun. A empresa começou fabricando bases prontas para farmácias de manipulação e depois lançou suas próprias marcas nos mercados: profissional, com Max Bella; e institucional, com Max Soap, até fincar os dois pés no mercado de cosméticos para o varejo com a aquisição da marca Aloe Cachos, de produtos capilares. Atualmente, a marca que responde pela maior parte das vendas da companhia, 40%, é a Cosmessência, de cremes 5 em 1, vendidos em potes de 1kg. “É a valorização dos cachos por um preço acessível”, conta.

Mas a empresária não quer que a sua empresa seja conhecida como fabricantes de potes de quilo. Por isso, está apostando alto numa linha nova, a MyB, com posicionamento premium. Os shampoos e condicionadores são comercializados numa faixa entre R$ 35 e R$ 40 (250 ml). No total, a linha tem 27 skus. “Estamos investindo para que My B seja o nosso grande negócio”, revela Kelly. A linha será distribuída apenas em lojas especializadas e farmácias. A empresária conta que a empresa sentia a necessidade de ter uma segunda marca para atingir outro perfil de público, que procura produtos de alta performance. E os distribuidores da empresa também vinham demandando uma linha de valor agregado maior. O foco da distribuição da Amazun é a região Nordeste, onde a empresa já atua, mas crê ter muito espaço para expandir.

Kelly está fazendo um investimento substancial para a nova marca acontecer, incluindo a contratação de promotoras para atuarem nas lojas e fazerem o movimento inicial do giro dos produtos, distribuição de amostras e em mídias sociais.

A executiva de Vendas da casa de fragrâncias Cramer. Ana Cláudia Menezes, reforça que os clientes estão demandando por mais coisas novas e, mais importante, têm dado abertura para inovações. ?Eles têm me demandado muito para desenvolver projetos. As empresas estão bem mais em linha com as tendências?, pontua Ana, que está no mercado de fragrâncias há um ano. Antes, atuou como gerente de Contas na Embelleze.

Falta ambição?

Que o sistema tributário brasileiro é horrível e só atrapalha a produtividade das empresas do País, todo mundo sabe. E que o sistema consegue ser ainda pior em alguns estados, também. Entre taxas de contribuição e abatimentos de alíquotas para vendas internas, tudo parece ser feito para complicar, ou quando muito, sobra boa vontade mas falta competência de quem elabora o regramento. De qualquer forma, as regras estão aí e, para crescer, é preciso superá-las. Nesse ponto, parece faltar ao pequeno empresário de cosméticos baiano a disposição para o crescimento, que, verdade seja dita, dá bastante trabalho. Só que a alternativa é, simplemente, definhar até ser expelido do negócio como uma empresa irrelevante. Ninguém monta uma empresa para isso.

Monica Burgos, sócia-fundadora da Avatim, acredita que o empresário baiano não é arrojado no sentido de correr mais riscos e ainda sofre um pouco por conta da falta de autoconfiança. “Creio que falte da turma da Bahia arriscar, mas arriscar com conhecimento próprio, porque são capazes. Agora, tem de correr riscos, porque no geral todos correm riscos. E, correr riscos, quando você tem um grupo e apoio, fica mais fácil”, aposta ela.

Como sobram exemplos de empresas que não querem deixar o SIMPLES, um modelo de tributação que tem uma operação simplificada (os contadores adoram indicá-lo), mas que não necessariamente é a melhor opção do ponto de vista tributário e financeiro, cabe a pergunta: falta ao pequeno empresário de cosméticos da Bahia ambição?

“Temos a necessidade de sair do Simples. Se não sairmos, a gente não cresce”, comenta Kelly Lima, da Amazun. A empresária espera deixar o simples em 2018 ou 2019, conforme os objetivos sejam alcançados.

O Sebrae começou recentemente a fazer um trabalho em cima das pequenas empresas de cosméticos da Bahia. A entidade está estudando o setor para entender melhor seus principais gargalos, como cadeia de abastecimento, relação com o varejo local e, claro, questões de ordem tributária e de gestão. É muito provável que muitas dessas empresas não queiram abrir mão do simples por mero desconhecimento sobre como funciona de fato a tributação e o recolhimento das diferentes contribuições e taxas as quais as empresas tupiniquins estão sujeitas.

Uma prática muito comum entre as empresas locais, mesmo algumas das maiores, é abrir vários CNPJs para de alguma forma, manter a tributação da empresa no modelo simplificado. Ainda que isso represente algum ganho de curto prazo, é muito difícil gerir de maneira consistente e sustentável uma companhia nessas condições. “Essa coisa de quebrar o negócio em três, quatro empresas é muito ruim, além de ser uma concorrência desleal”, pontua Rafael Mamede, diretor de Operações da Aromarketing. “Investimos muito na empresa pensando no que ela pode ser em cinco, dez anos”, emenda.  Kelly, da Amazun, também afirma não compactuar com essa prática de ter vários CNPJ?s para se manter no Simples. “Conheço empresário que prefere não crescer a sair do sistema. Gente que já negou venda para não sair do Simples. Na nossa cabeça isso não entra”, complementa a empresária.

Tudo isso somado – gestão, visão de negócios, capacidade de entender os consumidores e de atuar em diferentes frentes, é um desafio já lançado. Muitas empresas baianas não devem aguentar suportar esse processo. E é bom que esse processo de depuração aconteça. “O que pode acontecer com as empresas que já tem um tempo de mercado é que elas vão se manter estagnadas. Temos um público na Bahia de menor poder aquisitivo e que busca um produto de menor valor ainda. Alguns (players) vão ser engolidos, sendo que alguns já foram, inclusive. Se o empresariado baiano não tomar cuidado e perceber que precisa investir, muitas vão sofrer e ficar estagnados”, alerta Cristiane Franca, represente comercial da casa de fragrâncias Vollmens. Na atual conjuntura, certamente é melhor um número menor de empresas mais bem arrumadas e com real potencial de crescimento dominarem o mercado, do que ter uma série de empresas pouco produtivas e que nada agregam ao consumidor, só bagunçando o mercado.

Fonte:https://panoramafarmaceutico.com.br/2018/02/20/bahia-um-mercado-em-busca-de-identidade/

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