A decisão de Nelson Tanure de investir no varejo, num momento de ações em baixa, avançou meses atrás, quando o investidor fez uma compra de posição no GPA, dono da rede Pão de Açúcar. Esse movimento ganhou força cerca de três meses para cá, e, neste momento, Tanure não faz novas compras de posição na varejista, dizem fontes. Em ações diretamente, Tanure tem 5,7% da empresa.
O maior acionista do GPA continua a ser o grupo francês Casino, por meio do veículo de investimento Segisor, com 20,4% dos papéis ON. Mas não há mais interesse estratégico dos franceses no investimento no Brasil.
O Valor apurou que interlocutores de Tanure já acenaram, a acionistas do Casino, sobre o interesse no GPA. Não há negociação envolvendo compra de posição dos franceses na varejista hoje. Segundo uma pessoa a par do assunto, o contato foi apenas “formal”. Procurado, Tanure preferiu não se manifestar
Com 66% das ações do GPA no mercado, eventuais aquisições de posição da rede não dependeriam de uma negociação com o Casino, mas uma aproximação pode ser interessante para evitar qualquer “ruído” entre as partes, diz a mesma fonte.
Na edição de sexta-feira (13), o Valor antecipou o plano de Tanure de criar uma “corporation” de varejo alimentar, e unir GPA e rede Dia. O investidor já seria hoje o segundo maior acionista individual do grupo, com posição maior que a de Ronaldo Iabrudi, ex-CEO do GPA.
A ideia inicial seria adquirir o controle do Dia, e estabilizar a operação da cadeia antes de uni-la ao GPA – o que poderia ocorrer até a metade do ano que vem, dizem fontes. Até porque, sem apresentar ao mercado um negócio mais estruturado e com menor risco, não faria sentido um acordo das duas empresas, e o Dia ainda é uma companhia em dificuldades.
A rede Dia é controlada pelo Lyra FIP II Multiestratégia, da gestora MAM Asset, que faz parte do grupo de investimento de Maurício Quadrado (ex-Banco Master).
O Valor apurou que houve compra de participação do GPA antes mesmo de o plano de fusão com o Dia amadurecer mais.
A transação tem sido discutida entre Tanure e Quadrado, que vê alto potencial numa eventual transação de Dia com GPA, e tem uma relação próxima a Tanure, dizem pessoas a par do assunto.
A intenção seria manter os pontos imobiliários do Dia na nova empresa, mas deixar de operar a marca, e acelerar a expansão orgânica do Pão de Açúcar, rede de varejo premium, com alta taxa de retorno. Além disso, a fórmula do Minuto Pão de Açúcar, loja de vizinhança do GPA, após acertos feitos no modelo, se tornou bem sucedida, e haveria espaço para o seu crescimento nos pontos do Dia. São cera de 300 unidades do Dia em São Paulo.
O mercado se mantém cético em relação ao GPA há tempos, após diversos rumores de interesse de investidores na empresa, sem nenhum avanço. Isso ocorria num ambiente de dificuldades de governança na gestão anterior, dos franceses do Casino, e alavancagem alta até parte deste ano.
Mas o Casino reduziu pela metade a sua posição na empresa, e o nível de endividamento da rede caiu de forma relevante (de 10,6 vezes para 2,8 vezes a relação dívida líquida e Ebitda, em cerca de dois anos), após venda de ativos e injeção de capital. O Ebitda mede lucro antes de juros, impostos, depreciação e amortização.
Esse cenário foi acomodando problemas que espantavam os investidores, só que a posição geral ainda é de cautela do mercado no segmento de varejo, e isso inclui o setor alimentar. Esse ambiente poderia abrir uma oportunidade para Tanure no GPA.
Desde que o Valor publicou a informação sobre o projeto, as ações do GPA subiram 21% – o valor de mercado do grupo gira em torno de R$ 1,3 bilhão, e só a marca Pão de Açúcar vale mais que o dobro disso. Ontem, a alta na ação foi de 15,61%, reflexo de um anúncio feito pelo GPA durante a manhã.
O grupo varejista informou, em comunicado, que fundos da Reag Trust atingiram 5,69% do total de ações emitidas. Essa posição equivalia ontem a cerca de R$ 78 milhões. As movimentações de Tanure têm sido feitas por meio da Reag, apurou o Valor.
Ao se somar com operações com derivativos, com exposição equivalente a 3,87% do total de ações da companhia, o percentual totaliza 9,56%, diz a nota.
O GPA está em reestruturação há anos, numa série de medidas tomadas, pelo menos, desde 2016, para por a rede nos eixos. Alguns indicadores operacionais melhoraram, apesar da reorganização ainda não ter terminado. No Dia, o cenário ainda é complexo. A companhia está em recuperação judicial, e o plano foi homologado há apenas dois meses. Há R$ 300 milhões em caixa, e R$ 1,7 bilhão em receita até setembro (foram R$ 3,9 bilhões em 2023) segundo dados de relatório publicado em novembro. O projeto atual consiste em retomar mais rapidamente o fornecimento de credores para melhorar vendas, manter investimentos baixos nas lojas e tentar recuperar a confiança dos clientes.
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