Setor tem recorde de financiamentos públicos e reforça aposta em inovação, mas vive desempenho aquém do esperado em 2024
A indústria farmacêutica viveu um ano de contrastes em 2024. De um lado, o setor teve acesso a um volume recorde de financiamentos ao mesmo tempo em que redobrou a aposta em inovação. No entanto, a performance um pouco aquém da esperada e desafios conjunturais com a alta do dólar despontam como adversidades para este ano.
De acordo com Nelson Mussolini, presidente executivo do Sindusfarma, entre os fatores que contribuíram para o desempenho abaixo das projeções iniciais estão a ocorrência de eventos de gripe e resfriado fora de época. “Tivemos um maior número de episódios de casos em janeiro. Mesmo assim devemos crescer em torno de 11,5% em valores e 4% em unidades segundo a IQVIA”, afirma.
Mussolini também manifesta preocupação com o dólar acima de R$ 6, considerando que a indústria importa 95% dos insumos para a produção de medicamentos. “Dificilmente teremos um ano com rentabilidade boa. Apesar de ainda não terem saído os dados de reajuste dos medicamentos, sabe-se que haverá um desconto no preço dos produtos de lista positiva. E tudo isso deve influenciar na nossa atividade, que registrou avanço acima de dois dígitos nos últimos cinco anos”, alerta o executivo.
Reforma tributária para a indústria farmacêutica
A reforma tributária foi uma das grandes bandeiras da indústria farmacêutica em 2024, mas o texto final dividiu opiniões. “Tivemos uma possibilidade boa de um projeto que resolveria os problemas dos encargos dos medicamentos, mas infelizmente o Senado Federal e a Câmara dos Deputados, no último momento, não acataram propostas do setor e do Ministério da Saúde para diminuir ainda mais os tributos de medicamentos oncológicos e destinados ao tratamento do HIV, o que pode impactar o acesso a medicamentos pela população brasileira”, ressalta Mussolini.
Já Reginaldo Arcuri, presidente do Grupo FarmaBrasil, que reúne 12 empresas brasileiras de capital nacional, entende que a indústria saiu com o que era essencial, como a inclusão dos medicamentos na redução de 60% em relação à alíquota modal. “Conquistamos aquilo que representava um pedido histórico do setor, que foi o fim das listas positivas, negativa e neutra”, avalia.
Inovação: o protagonismo da indústria nacional
As empresas do Grupo FarmaBrasil investirão R$ 20 bilhões até 2027, sendo R$ 13 bilhões somente em Pesquisa & Desenvolvimento. Os R$ 7 bilhões restantes serão convertidos em benfeitorias, instalações, equipamentos, máquinas e fábricas. “Isso é um claro reflexo de como o foco da indústria farmacêutica nacional em inovação está sendo seguido à risca, com laboratórios investindo entre 6% a 14% do faturamento líquido em P&D”, ressalta Arcuri.
A indústria nacional também foi a que mais recorreu a financiamento do BNDES, totalizando R$ 2,5 bilhões de empréstimos contratados.
“Além disso, os investimentos na construção e expansão de fábricas que já haviam sido iniciados tiveram continuidade no ano passado. Para 2025 nós, certamente, vamos ter um conjunto muito importante desses parques fabris iniciando suas operações”, afirma Arcuri.
Ele acrescenta que tem ficado cada vez mais evidente a importância estratégica da indústria brasileira para o país. Prova disso foram as visitas do presidente Lula nas inaugurações das plantas da Biomm e da EMS e do Ministro da Ciência e Tecnologia à Libbs.
“Me arrisco a dizer que a Indústria farmacêutica nacional está se caracterizando como uma espécie de “nova Embraer”, reconhecida pela sua qualidade mundial e instalando modernas plantas e centros de P&D não só na América Latina, mas em vários países do Hemisfério Norte, como Canadá, Servia e Itália”, ressalta Arcuri.
Incentivos à produção local
Para Henrique Tada, presidente executivo da Associação dos Laboratórios Farmacêuticos Nacionais (Alanac), que conta com 71 empresas, o ano foi desafiador, mas também repleto de oportunidades. “Foi um ano de consolidação ainda maior do que os anteriores, com resultados muito positivos tanto em capacidade de produção como no lançamento de medicamentos produzidos no país”, afirma.
Segundo ele, destacaram-se os avanços em temas como bulas digitais, insumos farmacêuticos ativos e inspeções. “Também houve um significativo apoio do governo federal com a atualização do regulamento das PDPs e a criação do Programa de Desenvolvimento e Inovação Local (PDIL). Além disso, os debates em torno de temas como o avanço da inteligência artificial na área farmacêutica, gerenciamento de riscos e Boas Práticas de Fabricação realçam o compromisso com o desenvolvimento setorial”, acrescenta.
Retomada da política industrial para produção de IFAs
A pandemia da Covid-19 evidenciou a vulnerabilidade do setor na produção de insumos farmacêuticos ativos (IFAs). Desde então, a Abiquifi vem intensificando seus alertas sobre a vulnerabilidade do setor e os caminhos para sua superação por meio de políticas voltadas à inovação e produção radical.
“Entendemos que o lançamento do programa Nova Indústria Brasil, em janeiro de 2023, e o enfoque da Missão 2 no Complexo Econômico-Industrial da Saúde são respostas iniciais à vulnerabilidade que marca o setor”, declara o CEO Norberto Prestes.
Em 2024, o setor privado apresentou um engajamento crescente, refletido em iniciativas como os 38 projetos submetidos pela indústria para pesquisa e desenvolvimento, totalizando R$ 358 milhões de financiamento pela Finep. Já o III Censo IFA, realizado pela Abiquifi, Abifina e Fiocruz, identificou 37 empresas produtoras de IFAs para o mercado doméstico e exportação.
A contribuição dos genéricos
De acordo com Tiago de Moraes Vicente, presidente-executivo da Associação Brasileira das Indústrias de Medicamentos Genéricos e Biossimilares (PróGenéricos), em 2024 foram comercializadas mais de 2,16 bilhões de unidades de medicamentos dessa categoria.
Além disso, esses remédios geraram, desde o ano 2000, uma economia direta de mais de R$ 325 bilhões para consumidores e pacientes. Atualmente, existem 102 laboratórios comercializando genéricos no Brasil, com 4.665 apresentações disponíveis.
“Os medicamentos genéricos representam 38,61% do mercado total, e a expectativa é que essa participação atinja 40% nos próximos quatro anos. Nossos associados são responsáveis por cerca de 90% desse segmento e já representam 8% das vendas varejo de biossimilares no país”, explica o executivo.
Seguindo a movimentação do setor, o mercado de medicamentos biossimilares no varejo também registrou um avanço notável, passando de uma participação de 1,28% em 2021 para 7,98% em 2024, o que representou um aumento de 2.154,83% das vendas em unidades.
A relevância dos MIPs
De forma geral, o ano foi positivo para o setor de medicamentos isentos de prescrição (MIPs). “Embora tenha havido grandes desafios, especialmente em relação à reforma tributária, trabalhamos em conjunto com entidades do setor para garantir a inclusão da categoria no texto. Apesar dos desafios, o mercado seguiu seu ritmo de crescimento, e nossas associadas continuam entre as maiores empresas do Brasil”, pontua Cibele Zanotta, presidente executiva da Acessa – Associação Brasileira da Indústria de Produtos para o Autocuidado em Saúde.
Segundo ela, a entidade também obteve vitórias significativas no Congresso Nacional, com o avanço do projeto de lei voltado para a construção de políticas públicas para o autocuidado em saúde. “Embora ainda não tenha sido aprovado, o projeto avançou com debates profundos e construtivos, e seguimos confiantes no progresso dessa importante pauta”, avalia.
Fonte: https://panoramafarmaceutico.com.br/industria-farmaceutica-vive-desafios/
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