Consumidor busca por produtos de maior qualidade; possibilidade de acordos bilaterais pode resultar em expansão do mercado
Um inédito e amplo estudo sobre o mercado de bebidas alcoólicas, organizado pela Associação Brasileira de Bebidas (Abrabe) e pela consultoria KPMG, comprova que, a despeito da crise econômica que impactou fortemente o setor nos últimos anos, é possível voltar a crescer. A possibilidade de acordos bilaterais entre o Brasil e grandes mercados consumidores e uma radical mudança no hábito do consumidor de bebidas alcoólicas, identificada pelo estudo sobretudo nas classes A e B, podem resultar numa forte expansão tanto do mercado interno quanto das exportações. “Esse consumidor quer mais do que um produto de qualidade: quer vivenciá-lo da maneira mais ampla possível”, afirma Thaís Balbi Rodrigues, sócia de Estratégia da KPMG Brasil.
Essa busca por novas experiências sensoriais é verificada, segundo ela, em todas as categorias de bebidas. “O que era restrito ao mercado de vinhos e espumantes hoje se expandiu para as cervejas especiais e para os destilados”, diz Thaís. Uma das oportunidades que pode ser explorada é a associação com o mercado de turismo, tão bem-sucedida em outros países e que começa a se popularizar por aqui. “O mercado caminha para a conjugação entre elementos de diferentes setores econômicos: a experiência sensorial proporcionada pelas bebidas, aliada à gastronomia (marcada fortemente pela harmonização) e enriquecida pelo turismo nas localidades de produção das bebidas”, afirma Cristiane Foja, presidente-executiva da Abrabe. “As vinícolas no Sul do País fazem parte do roteiro turístico, assim como as cervejarias e cachaçarias ganham força em todas as regiões do Brasil.”
Nota-se também um cuidado maior por parte do consumidor, que nessa busca por experiências sensoriais e mais qualidade, passou a observar melhor as características da bebida, seus modos de preparo, a harmonização com a gastronomia e os aspectos relacionados ao consumo moderado. O aumento no consumo off-trade e a popularização do gim, que, segundo o estudo, é a bebida com o maior crescimento nos últimos quatro anos dentre os destilados, vêm fazendo dos drinks e coquetéis um lifestyle.
O fortalecimento e a sofisticação do mercado consumidor interno são de suma importância para que a indústria nacional seja mais competitiva no mercado internacional. O estudo aponta que há uma estabilidade nos volumes exportados nos últimos três anos, o que reforça um espaço para crescimento e a oportunidade para um movimento de internacionalização da bebida brasileira. A cachaça, por exemplo, por estar fortemente associada ao Brasil, tem enorme espaço para crescimento, assim como outros produtos nacionais, como as cervejas especiais, os espumantes e destilados, muitos deles premiados lá fora. “Apesar de a cachaça apresentar o segundo menor ticket no mercado local, é a bebida que tem o maior ticket médio para exportação”, afirma Cristiane. “Precisamos fazer um trabalho muito bem organizado de prospecção e marketing da cachaça nos grandes centros consumidores. O potencial é enorme.”
O recente acordo firmado entre o Mercosul e a União Europeia, se consolidado, também poderá impulsionar as exportações. “As oportunidades estão aí. Precisamos fortalecer nossos produtos, usufruir dessa dinâmica imposta pelos novos padrões de consumo e aproveitar o máximo possível essa retomada do setor”, completa Cristiane.
Altas cargas tributárias
É consenso entre as empresas de bebidas que, além da melhora da conjuntura econômica, a retomada só será possível se o setor não enfrentar novas altas de tributação. Segundo o estudo, desde 2015, após o aumento do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) dos destilados e da cachaça, acirrou-se a concorrência com um forte e cada vez mais poderoso mercado de produtos ilícitos. Conclusão: altos níveis de taxação podem resultar num efeito contrário. Ou seja, minar a indústria nacional, abrir espaço para o mercado ilegal – podendo criar um risco à saúde da população, especialmente a de menor renda, por dar margem ao aumento das bebidas falsificadas –, e, consequentemente, diminuir a arrecadação por parte da União e dos estados. “É uma ilusão achar que o consumo de bebidas alcoólicas vai diminuir com o aumento da tributação e do preço. O que pode aumentar é a ilegalidade, o estímulo a produtos de origem duvidosa e sem qualquer regulação”, afirma Cristiane.
Causa ambiental
Como uma associação que representa todas as categorias de bebidas (cervejas, vinhos, destilados e cachaça), a Abrabe também está atenta aos impactos ambientais do consumo. Afinal, parte das bebidas é envasada em embalagens de vidro, material 100% reciclável e que pode se tornar um grande aliado das causas sustentáveis. Por conta disso, a entidade começou a difundir neste ano um amplo programa de logística reversa do vidro. Batizado de Glass is Good, o projeto nasceu de uma iniciativa pioneira de uma de suas associadas, a fabricante britânica de bebidas Diageo. Em abril 2019, o Glass Is Good ganhou escala setorial e hoje segue como um dos principais programas de sustentabilidade conduzidos pela Abrabe. “Em nove anos, o programa reciclou mais de 59 milhões de garrafas, o que corresponde a cerca de 30 mil toneladas de vidro”, afirma Cristiane Foja. Além do Glass Is Good, a Abrabe também coordena o Ecogesto, programa com foco nas cooperativas e que atua em três pilares da sustentabilidade: ambiental, social e econômico. Atualmente, o Ecogesto tem cerca de 100 cooperativas distribuídas pelo País e fomenta a gestão e aplicação de práticas em sintonia com a Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS). “Esses dois projetos são de grande orgulho para nós da Abrabe e refletem a união de toda a cadeia produtiva do vidro em torno de um só objetivo: fazer esse ciclo funcionar de maneira mais responsável e sustentável”, afirma Cristiane.
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