Donos de ações preferenciais da Ambev não estão satisfeitos com uma das etapas da reestruturação pretendida pela companhia de bebidas. A operação prevê que a nova Ambev terá apenas capital ordinário e fixa em 1 para 1 a relação de troca dos papéis preferenciais (PN, sem direito a voto), pelos ordinários (ON, com direito a voto). Historicamente, as ONs da Ambev, menos líquidas, são negociadas na bolsa com um desconto perto de 13% em relação às PNs, que são mais negociadas e têm a vantagem de receber 10% mais em proventos (dividendos e juros sobre capital próprio). Os preferencialistas questionam porque exatamente agora, quando a empresa propõe uma reestruturação que terá como consequência clara o aumento da capacidade de distribuição de proventos, ela também deseja fazer a unificação das classes de ações extinguindo essa vantagem dos preferencialistas.

Um argumento que tem sido levantado por detentores de PNs da empresa é o fato de, pelo menos nos últimos seis anos, a Ambev ter realizado aumentos de capital mediante capitalização do benefício fiscal auferido com a amortização parcial da reserva especial de ágio. Nessas operações, feitas anualmente, sempre utilizou o critério de preço de mercado – inclusive em fevereiro passado, cerca de dois meses depois de ter anunciado a reestruturação em que usou o parâmetro de 1 para 1.

Nessas operações, portanto, o controlador sempre comprou as ações ordinárias com desconto, apesar de, na reestruturação, não estar avaliando o papel da mesma maneira. Procurada pelo Valor, a Ambev não deu entrevista.Na segunda-feira, a Ambev anunciou que a operação foi aprovada por seu conselho fiscal e destacou como benefícios da conversão alguns pontos que os preferencialistas não entendem exatamente como vantagens.Entre os apelos da operação, a Ambev informou que vai aumentar o percentual de dividendo obrigatório de 35% para 40% do lucro líquido ajustado. Os minoritários, no entanto, argumentam que, desde 2008, o “payout” [porcentagem do resultado distribuído em proventos) da empresa é acima de 50%, ou seja, já tem sido superior até mesmo do novo percentual anunciado.

Outro argumento é o de que, agora, os preferencialistas passarão a ter o direito de voto. No entanto, nas contas dos acionistas, concluída a reestruturação, os controladores ficarão com perto de 62% da nova companhia; 10% do capital ficará com antigos acionistas de empresas adquiridas e 28% ficará em circulação no mercado. Com um controle tão definido, o direito de voto não parece, na visão dos preferencialistas, também uma grande vantagem. Eles, inclusive já têm esse direito para casos específicos, como a atual reestruturação. Outro argumento da empresa é o de que hoje a preferencial não confere o direito de tag along (prêmio de controle). Após a operação, com as ordinárias em mãos, eles passarão a ter os 80% de tag along previsto em lei. Entretanto, os minoritários veem como reduzidas as possibilidades de venda da empresa, líder no seu segmento de atuação no Brasil e no mundo.

Ou seja, na visão dos acionistas, os preferencialistas, sem nenhum grande benefício, terão de abrir mão da vantagem de receber mais dividendos sem receber prêmio nenhum. E isso se dará exatamente em um momento em que a Ambev se prepara para ter uma maior capacidade de distribuir os proventos. A operação brasileira é forte geradora de caixa. Já a controladora é um pouco mais alavancada, embora em um patamar confortável. Conforme o último dado disponível, o indicador que relaciona a dívida líquida e o Ebitda (lucro antes de juros, impostos, depreciação e amortização) está em 2 vezes. A reestruturação proposta pela Ambev prevê a criação de uma nova empresa, que incorporará a “velha Ambev”. Uma consequência clara da operação vai ser uma flexibilização da estrutura de capital da companhia. Na operação, a “nova” empresa, Ambev SA, vai incorporar a “velha”. Como resultado, haverá praticamente uma espécie de “marcação a mercado” do patrimônio da Ambev. Os analistas ainda não chegaram ao valor final. Como observaram os analistas do BTG Pactual em relatório, ainda não está claro se o capital total da Ambev SA poderá aumentar dos atuais R$ 30 bilhões para R$ 97 bilhões ou para R$ 127 bilhões. Considerando o primeiro valor, mais baixo, os analistas estimam que com isso a empresa vai aumentar a sua capacidade de juros sobre capital (JCP) próprio em R$ 5 bilhões por ano. O pagamento de JCP é calculado a partir da multiplicação do patrimônio da empresa pela TJLP (Taxa de Juros de Longo Prazo).

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Além disso, a remuneração do acionista via juros sobre capital próprio gera o chamado “tax shield”, uma espécie de benefício fiscal, porque os juros sobre capital próprio são dedutíveis da base de cálculos do Imposto de Renda. A economia com impostos da empresa chegaria a R$ 1,2 bilhão, o que também serviria para elevar seu lucro. Essa possibilidade de incremento no lucro, na avaliação de alguns analistas, também poderá ser importante para a distribuição de dividendos da empresa. A Ambev tem distribuído 10% da sua geração de caixa em dividendos e o “payout” da companhia é hoje limitado pelo lucro. Se o lucro da empresa for menor do que a geração de caixa ela não poderá distribuir a totalidade desses recursos como tem feito. Há analistas que acreditam que, no curto e médio prazos, a empresa possa gerar mais caixa do que lucros. Essa análise, que nunca foi feita pela própria Ambev, é de alguns analistas que esperam que a companhia possa reduzir investimentos no segmento de cervejas no Brasil a partir do próximo ano. A empresa já teria realizado os investimentos necessários para fazer frente às expectativas de demanda. Com investimentos menores, a sobra de caixa poderá ser maior.

Além disso, os acionistas afirmam também que a empresa poderá fazer uma distribuição extra de dividendos por conta de lucros acumulados. Os preferencialistas enxergam os benefícios da operação para a remuneração ao acionista daqui por diante. No entanto questionam porque ela necessariamente precisará ser acompanhada pela unificação das duas classes de ações. E, se de fato, for imprescindível, deverão pleitear um prêmio para aceitar a operação. Uma das sugestões possíveis seria um cálculo da diferença de preço entre as duas classes de ações 30 dias antes do início da reformulação. Até o momento, acreditam que não vale a pena entregar a vantagem sem prêmio, mesmo considerando o incremento de proventos futuro. A Ambev deverá chamar duas assembleias para deliberar sobre a reestruturação – uma delas só de preferencialistas e outra dos minoritários ordinaristas. O controlador, portanto, ficará de fora da votação. Hoje, 49,35% do capital preferencial da empresa está em circulação no mercado.

Os detentores de PNs também acreditam que, ao final da reestruturação, as ações da Ambev terão a liquidez reduzida, pelo menos em um primeiro momento, uma vez que boa parte das operações realizadas hoje com o papel são para arbitrar a diferença de valores entre PNs e ONs.

Fonte: http://www.valor.com.br/empresas/3123874/para-trocar-acao-da-ambev-pn-pede-premio

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